domingo, 20 de setembro de 2009

COMANDANTE


A figura charmosa do Ditador é tão atractiva para quem não é directamente reprimido que alimenta inúmeras peças de cinema de qualidade diversa, exterior à definição de ditador que cada um tem consigo. Ditador é alguém que dita, que controla, que se guia pela sede pelo poder e que se prolonga nele, sobrepondo-se a outros. E assim é Fidel ditador, independentemente das simpatias partidárias.

Dois dos filmes que vi recentemente versavam sobre a temática apaixonante dos ditadores em formatos distintos e com resultados também diversos: o académico Il Caimano de Nanni Moretti e o biopic desgarrado W. (também de Oliver Stone como este Comandante).

Nota-se na irregular obra de Stone uma atracção assumida e monográfica pelas figuras carismáticas (também dele JFK e Nixon) e se neste último iniciou a sua visão sobre os estadistas malvados diabolizando Nixon ou deixando em W. que Bush se ridicularize, neste Comandante, Fidel surge fragilizado pela doença e quedado pela idade, num híbrido objecto que não é uma reconstrução biográfica nem um doc – mas sim uma conversa informal entre um estadista no ocaso da sua governação de 49 anos e um americano herói do Vietname, entremeado com apontamentos de época, muitos deles parciais do ponto de vista americano. Fidel permite que Stone avance com questões a que um vulgar ditador não se permitiria, acusando impertinência, como dos relacionamentos amorosos e do recurso a terapias psiquiátricas ou ainda questões específicas como do presumível afastamento de Che da política cubana por incompatibilidade, da perseguição aos homossexuais e da suposta presença de conselheiros cubanos em Hanói – tudo graciosamente afastado por um líder que nunca deixou de ser honestamente simpático dentro da sua reconhecida brutalidade.

Stone não deixa de ser americano no seu contacto com Fidel e assim a conversa fixada como entrevista debruça-se sobre a bipolaridade da Guerra Fria, a questão dos mísseis de Cuba, o desastre da Baía dos Porcos e ainda o ridículo novelístico de Elián, que se sobrepõem sobre o que seria bem mais interessante conhecer como as repercussões do eterno embargo americano, as condições económicas actuais do povo cubano e sobre o modo em que a Revolução contribuiu para que Cuba florescesse (e se de facto floresceu) após o protectorado americano de Baptista. Comandante não acrescenta nada ao que já sabemos e o que procuramos saber revela-se melhor nos livros de Gutiérrez ou até no Antes que Anoiteça de Schnabel. As filmagens são de 2003, pelo que também é aflorada a questão do terrorismo e da nova ordem mundial, mas sem consistente continuação e até se comenta Perón - com o musical Eva em fundo - Hemingway e Allende, mas sem a merecida profundidade. Continuará Fidel a usar as suas Nike sem o nos terem revelado como se quereria.

ler crítica na TAKE n9 :: http://www.takecom.pt

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